quinta-feira, 28 de outubro de 2010

Por escrito

Vou te dizer que eu gosto de analisar como a nossa língua portuguesa é amassada e entortada pra se encaixar nos pequenos espaços vagos no cérebro de cada "cultura". E de como alguns irônicos paralelos se traçam quando a gente passa a comparar.

Por exemplo: a gramática falada hoje nas empresas (uma salva de palmas pra caravana do telemarketing) tem como característica principal o gerundismo, que é aquele tal de dizer que "estará fazendo", "estará efetuando", tralalá. Nenhuma novidade e, corrija-me se equivocado eu estiver, nada de errado também (um tanto inadequado, só).

Mas eu gostaria de lançar luz sobre a escrita, que é bastante menosprezada pelo humor sem graça corporativo. Se há na língua falada o gerundismo, na escrita há o infinitivismo.

Repara: é tudo no infinitivo. Até o banner desse blog na minha outra casa é assim (se você não reparou o gracejo, sinto muito, você foi engolido pelo sistema). Mas não só isso: as frases são simplificadas ao máximo, até o esqueleto. Veja nos post-its grudados no seu escritório: é "Silvio, ligar Joana" pra cá, "Rosana, fazer relatório" pra lá. Alguns bravos defensores dirão que é falta de tempo, mó correria e etc. Mas eu digo o que é: é atrofia cerebral.

Pode olhar em todas as histórias que mostram índios que não tem muito domínio do português: eles sempre falam tipo "mim gostar amorzinho" e coisas assim. Igual a você e seu papelzinho amarelo ridículo. Mas sabe a diferença? Os índios tem seu próprio idioma, e tão no português de freelance. Mas nós só temos o português. A permanecer essa involução, em breve só nos restarão meia dúzia de frases copiadas de seriados em uma língua estrangeira.

O trabalho emburrece o homem, é verdade. E não há alternativa para evitar que em breve estejamos nos comunicando por grunhidos metálicos. Na verdade há, mas isso envolveria todo mundo tomar vergonha na cara e parar de escrever como retardado. Como proatividade empresarial é uma parada que só funciona quando é pra impressionar chefe, dá pra afirmar que estamos mesmo numa locomotiva sem freio rumo ao abismo das vogais sem sentido. Só vamos nos dar as mãos e torcer pra morrer de alguma outra coisa antes disso.

segunda-feira, 18 de outubro de 2010

A gostosa do escritório

Antes de começar, devo já pedir desculpas pelo tom meio machista desse post. Não é essa a ideia do blog, mas, convenhamos, o lance do colega com sex appeal no talo é mais que obrigação por aqui. Como eu não tenho autoridade para falar sobre o outro lado da mesa, gostaria de pedir a sua colaboração para o post sobre "o gostoso do escritório". Mandem depoimentos e opiniões, não precisam assinar, e não precisa, claro, ser mulher pra escrever - aliás, adoraria ver o ponto de vista gay sobre o assunto. É só escrever pro thiagopadula@gmail.com, e não precisam se preocupar com a redação, disso cuido eu ;)


Dados os recentes acontecimentos, estão em alta profissões que se caracterizam pela ausência (ou baixíssima-íssima presença) de colaboradores do sexo feminino no local de trabalho, como mineiros, pedreiros e, ahn, piratas. Entre esse e o outro extremo - lugares que só tem mulheres - há os ambientes mistos, aqueles que tem homens e mulheres, todos juntos, todos felizes.

Eu já passeei pelo assunto em outro post, e a ideia é essa: evidente que atração sexual não fica da porta do escritório pra fora, porque não dá pra controlar esse tipo de coisa. E homem, essa raça triste da porra, é inflamavelmente suscetível a qualquer estímulo vindo de onde não balança um pênis. Tipo, chega a ser ridículo. Se você, minha amiga, acha que os homens no seu trabalho não ficam comentando sobre você e suas colegas quando estão longe dos ouvidos femininos, surprise!, você está errada.

E, já que Deus é um cara legal, existem as musas, as divas, as gostosas do escritório. Aquelas pra quem todo mundo traz café de manhã, aquelas que todo mundo chama pra almoçar, aquelas que todo mundo se oferece pra ajudar no trabalho. E aquelas - ai, essa humanidade - que vão sempre ter sua beleza como contra-argumento da sua competência técnica, como se pra ser boa no que faz a pessoa tenha que necessariamente abrir mão da aparência.

O lance é que o ambiente de trabalho é um tema central no relacionamento entre empresa e funcionários - estes anseiam por um bom ambiente, aqueles fingem que estão se importando. Todo mundo quer um lugar bacana e que torne menos dolorosa a sensação de ver a história da sua vida sendo contada por uma carteira de trabalho, e, correndo o risco de parecer um panacão escroto ao dizer isso, afirmo: mulher bonita no escritório melhora o ambiente de cem a quatro milhões por cento.

Sim, porque é legal olhar pra elas. Sim, porque é legal conversar com elas. Sim, porque é legal imaginar que, num dia de hora extra, estresse e coisa e tal, há um fio de chance de vocês dois se pegarem num fight no meio das baias - não dá pra ficar muito mais patético que isso, mas é assim que somos. E, sim, todas as outras mulheres do escritório ficam eclipsadas, mas essa é a vida. A produtividade cai? Cai. Mas outras coisas sobem, e assim vai-se mantendo o equilíbrio, ainda que ele não seja exatamente justo para todas as partes envolvidas.

Claro que esse assunto pode ficar só na borda da inocência masturbatória platônica, mas às vezes a coisa começa a afetar a ética e o profissionalismo. Exigir "boa aparência" em vaga de emprego já é, pra começar, uma safadeza. Contratar mulheres pela beleza ao invés do currículo para cargos que não peçam um pouco mais de asseio na aparência é outra. Mas às vezes os fins justificam os meios, e se de boas intenções o inferno está cheio, ótimo - é pra lá que a gente tá indo. Desculpa aí.


Tema do post sugerido pelo Marcelo ;)

quarta-feira, 6 de outubro de 2010

Café

Assim como outras modalidades de sofrimento contínuo (ex. Vida), o cotidiano no trabalho precisa de algumas janelas para a gente abrir e se jogar respirar. E, ao contrário do álcool, há uma bebida mágica e de efeito poderoso que pode ser ingerida durante o expediente: o café.

Confesso: não sou fã do líquido negro. Sendo um pouco menos eufemístico, não gosto mesmo. Sou uma espécie de careta corporativo. Porque é exatamente isso que o café representa: uma droga. Quando a máquina da empresa quebra eu consigo ver estampado e piscante nos rostos dos colegas os efeitos da abstinência. O mau humor, a falta de concentração, a falta de vontade de viver. O café é o melhor amigo do assalariado.

Mais que isso, ele também promove a comunhão entre os coleguinhas. E é, entre os quatro elementos socializantes fundamentais (café, happy hour, cigarro e almoço), o único que ocorre sob o teto da penitenciária. A menos que sua empresa tenha um refeitório, claro. Mas o círculo que se forma em volta da copa é outra das coisas pelas quais o café é tão importante: muitas vezes, é a única oportunidade que algumas pessoas tem de interagir.

E já que a comparação óbvia do café é com uma droga, natural imaginar que essas conversas tendam à psicodelia. Começa sempre com amenidades (feriado na praia, reforma em casa, campeonato brasileiro) e daqui  a pouco já estão citando todas as maneiras diferentes de matar uma chinchila. É nessa hora, o momento em que o freio da postura corporativa quebra, que a coisa começa a ficar interessante: conversas sobre intervenções cirúrgicas no pênis, relatos de atrizes pornô na balada desafiando a anatomia com objetos policiais, decupagem e interpretação de clássicos da música popular. Não tem limite, não tem regra, só o prazer subversivo bobo.

Sempre me lembro do menino dopado que saiu do dentista e pergunta "is this real life?". Não é, Dave, e não é, amigo viciado em café. Agora toca a trabalhar de novo, porque falta muito pra sexta-feira.


Tema do post sugerido pelo Fernando, vulgo Fininho ;)